2 - O EXECUTIVO LEANDRO

 

Levantou-se, ajuntou o seu material e, junto com aquelas duas fotografias, colocou tudo em sua pasta. Colocou-se a caminho da empresa. Leandro tornou-se um executivo eficiente de uma empresa de telefonia móvel, obtendo resultados e respeito das pessoas que coordena. Já há um bom tempo foi efetivado nessa empresa, passando por vários cargos, Assistente Administrativo, Supervisor Administrativo, Gerente Administrativo, Administrador, até chagar a Diretor Administrativo. Seus dias intermináveis passaram a ser preenchidos por vários verbos: fixar objetivos, planejar, analisar, conhecer os problemas, solucioná-los, organizar e alocar recursos financeiros, tecnológicos e humanos, comunicar, dirigir, motivar, liderar sua equipe, tomar sérias e fundamentais decisões, mensurar e avaliar negociações. 

Durante todos esses anos, ninguém mais entrou em sua vida e coração. Continuou a não ter vida social, substituindo-a por elaboração de planos, pareceres, relatórios, projetos, arbitragens e laudos, em que se exigia a aplicação de conhecimentos inerentes às técnicas de administração. Por suas sérias atitudes conseguiu a admiração de seus colegas, superiores e até concorrentes, por ser proativo, ousado, criativo, cumpridor das promessas, saber utilizar seus princípios, ser cooperativo e ser um bom líder. Pós-graduado, cursou algumas MBA e doutorou-se em Administração.

Algumas de suas colegas, secretárias ou estagiárias até tentaram aproximar-se dele com outras intenções, pois era um homem que toda mulher gostaria de ter como marido. Só que ele sempre saía dessas situações com educação. Com algumas até chegou a imaginar ter um romance, mas não tomava iniciativa. 


Em certo momento do dia, sozinho em sua sala, lembrou-se das duas fotografias na pasta. Apanhou-as, sentando para apreciá-las. Voltou novamente ao passado. Questionou-se, permitindo-se mergulhar no mundo da fantasia: o que poderia ter acontecido se ele tivesse se declarado a Milena?

* * *

Uma semana antes do fim das aulas. Ambos se encontram na sala de leitura para fazer um último trabalho em dupla. Em dado momento, Milena levantou-se, indo tomar água. Leandro aproveitou, colocando a carta-confissão dentro da agenda dela.

Dias depois, encontraram-se por acaso no corredor da universidade. Ao vê-la, suou frio. A moça foi direto ao assunto:

– Leandro, precisamos conversar...

– Sobre? – Fez como se não desconfiasse de nada.

– Aqui não. Está um dia tão lindo. Vamos até o jardim, naquele banco de sempre?

– Sim, vamos.

Lá, ele continuava sem jeito. Ainda mais quando ela foi direto ao assunto:

– Encontrei a sua carta na minha agenda.

E agora, o que falar? Segundos pareciam infinitos na sensação psicológica. Mas alguma coisa precisava ser dita:

– O que você achou?

– Suas palavras foram lindas. Não sou tudo aquilo que você escreveu.

– Garanto que é.

– Qualquer mulher ficaria feliz de receber uma carta daquelas.

– Mas eu não quero saber de qualquer mulher. Quero saber de você...

– Não sei o que dizer. Tipo assim... Você é um cara muito legal, alguém realmente para namorar sério. Só que não sei se estou preparada para um novo relacionamento.

Nesse momento, Leandro, não se contendo, segurou fortemente o rosto dela com as duas mãos. Lentamente foi se aproximando até encostar seus lábios com delicadeza nos dela. E aquela atitude tornou-se um profundo, intenso e demorado beijo. Ao terminarem, perguntou-lhe:

– E agora?

– Acabo de me decidir. Vamos tentar...

– Então diz novamente aquela pequena frase que você pronuncia com tanta meiguice.

– Qual? – Indagou-lhe em um leve sorriso, inclinando o rosto para o lado.

– “Tipo assim...”!

– Seu bobo...

E entre beijos e carícias, passaram toda aquela tarde ali mesmo, no banco de jardim. Houve oportunidade para fazerem planos. Como namorarem por algum tempo escondidos. Não que houvesse motivo para isso. Mas para dar um clima a mais e fortalecer a relação. Esse segredo durou por uma semana. Na apresentação do trabalho final de Leandro, ao final, enquanto todos o aplaudiam, Milena, não se contendo de alegria, beijou-lhe com vontade à boca, revelando publicamente aquele romance, dando ainda mais fascínio àquele momento.

Dias depois, ele foi à casa de Milena. Conversou com seus pais, pedindo-a oficialmente em namoro. Tinha receio de ser rejeitado pela diferença de idade. Só que aquela família equilibrada, que sempre deu liberdade à filha, não se opôs, respeitando a vontade da moça. E a partir daquele momento, Leandro passou a frequentar a casa e, por tabela, ter uma família.

Ele corria o risco de ser mal comentado socialmente devido ao velho preconceito que afirma que um homem quase maduro quer namorar moças novas para aparecer, para se autoafirmar. Mas não ligava para isso. Sabia que o sentimento por ela era verdadeiro e puro. Tratava tão bem sua namorada que ela estava cada vez mais envolvida por ele. Juntos frequentavam as festas, os churrascos da turma, os bailes, restaurantes da cidade. Cada vez mais, Leandro foi se integrando ao seio da sociedade guaragudense.

Leandro rejeitou a proposta de emprego que recebeu de uma importante empresa de telefonia móvel da capital. Abrindo mão de uma carreira promissora de executivo, começou a enviar seu currículo para empresas da região. Queria permanecer ali, junto da sua namorada e do mundo dela. Logo foi chamado para trabalhar como administrador de uma usina de açúcar e álcool na zona rural, ali mesmo em Guaragudos.

Como ele saía do serviço uma hora antes dela, todas as tardes ia sentar-se no banco da praça da igreja matriz no centro da pequena cidade e esperar o momento de ela fechar sua loja, para juntos irem até a casa da moça. Algumas vezes, namoravam ali mesmo no banco. Outras no portão da casa.

Em um desses momentos de espera, Leandro ficou observando aquele movimento central de uma pequena rua comercial de cidade interiorana. Igual a tantas outras cidades que ele já havia conhecido como jornalista. Lembrou de quando também observava o comportamento das moças. Sempre oriundas de famílias de sítio ou de trabalhadores e comerciantes, vestiam simplesmente jeans, bermudas, tênis, sandálias, chinelinhos, blusinhas. Caridosas, simpáticas e preocupadas com o próximo. Trabalhavam ou estudavam, sempre levando a sério suas tarefas. Amigavelmente viviam em comunidade e eram de profunda religiosidade. De poucos namorados, em geral alguém de sua adolescência era o seu único parceiro. E quando casavam, tornavam-se dedicadas esposas. Leandro sempre almejou casar-se com uma moça com essas características. E, naquele instante, sentiu que seu sonho estava próximo.

Um ano se passou. Agora chegou a vez de Milena se formar. No baile da turma, enquanto dançavam de rostos colados, o rapaz não se conteve em perguntar-lhe ao pé do ouvido:

– Milena, agora não há mais nada que nos impeça de começar uma nova etapa em nossas vidas. Você quer se casar comigo?

A moça deu-lhe um profundo beijo na boca, indagando-lhe:

– Isto responde a sua pergunta, meu amor?

PRÓXIMO CAPÍTULO

Emílio Figueira - Escritor

Por causa de uma asfixia durante o parto, Emílio Figueira adquiriu paralisia cerebral em 1969, ficando com sequelas na fala e movimentos. Nunca se deixou abater por sua deficiência motora e vive intensamente inúmeras possibilidades. Nas artes, no jornalismo, autor de uma vasta produção científica, é psicólogo, psicanalista, teólogo independente. Como escritor é dono de uma variada obra em livros impressos e digitais, passando de noventa títulos lançados. Hoje com cinco graduações e dois doutorados, Figueira foi professor e conferencista de pós-graduação, principalmente de temas que envolvem a Educação Inclusiva. Atualmente dedica-se a Escrever Literatura e Roteiros e projetos audiovisuais.

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