JUCA, O BOLEIRO

SINOPSE: Na escola, a turma do oitavo ano sente a falta de Juca, um colega cadeirante, descobrindo que ele foi transferido por falta de acessibilidade no local. Iniciam ao movimento para sua volta e, ao mesmo tempo, pedem que sua escola seja toda adaptada e inclusiva. Descobrem que Juca é jogador de Power Soccer, modalidade de futebol em cadeira de rodas elétrica. Ao ser remodelada, a escola recebe de volta Juca e outros alunos com outros tipos de deficiências e surgem grandes mudanças que não imaginavam.

 

CADÊ O JUCA?

Hora do intervalo, uma manhã linda e ensolarada. Pelo pátio, o pessoal das séries iniciais corre, brinca. Na cantina os alunos disputam a atenção dos atendentes. Outros comem seus lanches espalhados por todos os cantos. Os alunos maiores papeiam pelos celulares, outros olham o instagram, outros conferem seus facebooks. Algumas adolescentes falam de roupas da moda, cabelo, namoradinhos. Os rapazes conversam sobre as meninas, esportes, programas de fim de semana, tomam refrigerantes.

Um grupo se reúne na arquibancada da quadra de esportes. É a chamada “Turma do Oitavo”, justamente por estarem no oitavo ano.

Entre eles está Pedro, um garoto afrodescendente, muito de bem com a vida, amigo de todos e inteligente. Destaque na turma por sua altura e corpo long líneo. Tem rosto arredondado, nariz de batatinha e lábios carnudos. Sua pele é negra, com cabelos estilo afro muito bem cuidados. Olhos castanhos e bem marcantes. Costuma vestir-se muito simplesmente. Usa jeans, camisetas básicas e tênis. Carrega uma mochila preta com desenhos nas costas, onde sempre tem contigo o uniforme do time de futebol. Destaca-se por seu bom humor. Ele comenta:

- Pessoal, hoje após a aula temos treino aqui na quadra. Não se esqueçam.

- Verdade, moçada. E o professor Caiola está pegando pesado no treino. Semana que vem começa o campeonato InterColégios de nossa região – lembra Rodrigo, um menino de estatura normal para sua idade. Cabelos lisos jogados de lado, olhos castanhos, nariz afinado e lábios finos. Não faz questão de se destacar por suas características físicas. Procura sempre estar de uniforme escolar, quando não, gosta de usar calças mais leves e camisetas de time de futebol. Sua mochila é marinho com o uniforme do time.

- E como todo ano, novamente eu serei o artilheiro do campeonato! – diz Mário.

Mário é o tradicional garoto que se acha o máximo. Apesar de seu ótimo porte físico, sua exibição faz com que alguns colegas se afastem ou o achem muito metido, enquanto algumas garotas se derretem ao vê-lo passar. Quando não está vestido com o uniforme do time escolar, costuma estar dentro da tendência do momento, com roupas da moda. Suas calças são justas ou saruel, sapatênis sempre combinando e as camisetas também mais justinhas, próprias para destacar seus braços torneados pelo esporte. Tem estatura mediana, cabelos aloirados e olhos castanhos esverdeados. Rosto quadrado com nariz médio, olhos grandes e lábios médios.

Lídia, uma garota tipo mignon, corpo sem muitas curvas, bem característico de sua nacionalidade japonesa. De estatura mediana, se destaca por sua dedicação aos afazeres escolares e seu coleguismo. Seus longos cabelos pretos e lisos deixam qualquer menina com inveja de tanto brilho. Rosto arredondado, nariz pequeno, lábios finos e olhos bem amendoados e negros. Está sempre vestida com uniforme escolar, calça jeans e camiseta com o logo da escola, quando não, só muda a camiseta por blusinhas tipo baby look, geralmente com desenhos japoneses ou escritos em katakana, não se afastando de sua descendência. Seus sapatos são sempre bem cuidados e os tênis estão sempre branquinhos. Lídia deixa de ver e-mais no seu celular moderno e rebate:

- Deixa de ser convencido, Mário... Você quer ser o melhor em tudo.

Todo o pessoal dá risada. Neste momento chega Anna, típica menina estudiosa. Não apresenta muitas vaidades, apesar de ser alta perto de suas amigas da mesma idade. Característica essa, que faz a mesma se destacar nas lutas sociais. Seu rosto tem forma retangular, olhos grandes e pretos, nariz médio, próprio para segurar seus lindos óculos redondos e de cor castanha. Lábios são finos e rosados. Cabelos compridos, castanho escuro e que vivem presos no alto da cabeça com um coque improvisado por uma caneta. Suas roupas básicas, nunca se destacam. Gosta de usar jeans, camisetas, a maioria com frases que falam de suas causas defendidas, geralmente colete jeans por cima e tênis meio surrado, no estilo de All Star. Nas costas, sempre sua bolsa companheira, onde guarda os informativos a serem distribuídos. Aproximando do grupo, Anna pergunta:

- Alguém sabe alguma coisa do Juca? Faz dois dias que ele não vem à escola.

- Como sempre, a Anna está preocupada com os menos afortunados – comenta Mario com um tom de ironia.

- Cala boca, cara – Pedro fica bravo: - Você perdeu uma grande oportunidade de ficar calado nesse mundinho só seu.

- Pode deixar, Pedro, não me importo com comentários vazios como esse – diz Anna.

Entre eles está Cláudia. Apesar de ser muito vaidosa e estar sempre com roupas da moda, sua característica principal é a amizade. Garota pequena, com um corpo bem formado, já apresentando forma de mulher e que sempre está muito bem vestida, além de suas calças saruel, skinny e boy friend, usa blusas com brilhos e estampas florais, quando não, costumiza o uniforme escolar, deixando-o mais na moda. O uso de acessórios, como pulseiras, brincos e colares, também a destacam. Sapatos, sempre com algum salto, quando não, tênis de marca. Seu rosto é bastante afinado, com pele branca, nariz fino e lábios volumosos. Seus cabelos são cacheados, de cor castanha, com mechas californianas, sempre muito bem cuidado e ajeitado. Tem sempre a tiracolo uma bolsa de grife, onde carrega seus apetrechos de vaidades, além de sempre ter dentro dela algo que possa adoçar seus amigos. Ela acrescenta:

- Realmente, o Juca não veio nem ontem nem hoje. Geralmente quando chega a hora do recreio, a Anna ou a Lídia ou eu empurramos a cadeira de rodas até o canto do pátio e ele fica ali comendo o seu lanche, ouvindo músicas no fone de ouvido, observando tudo e a todos.

- Gente, sabe que nunca pensei nisso? Afinal, na sala de aula, o Juca estuda normalmente como todos nós, participa das atividades. Quando chega no recreio, ele sempre fica no mesmo canto sozinho. E quando precisa ir ao banheiro, chama o inspetor de alunos e é levado no colo. Por quê? – Questiona Lídia.

Todos se olham mudos, sem ter uma resposta. Pedro, após quase um minuto de silêncio, rompe aquele momento de questionamento, revelando:

- Sabe, há uma coisa que acho muito engraçada e até me deixa curioso. Não sou amigo pessoal do Juca, mas moro na mesma rua que ele. Sempre vejo aos sábados ou domingos, ele sair de casa vestido como um jogador de futebol. O pai dele o coloca no carro, a cadeira de rodas no porta-malas e se vão não sei pra onde.

- Vestido de jogador de futebol!!! – Espantam-se todos.

- Pedro, já que você mora na mesma rua que ele, faça um favor para nós – pede Anna: - Hoje à tarde dá um pulinho na casa dele e vê o que está acontecendo.

- Pode deixar, eu vou...

Toca o sinal do fim do recreio. A turma vai descendo da arquibancada, quando Mário passa a mão nos cabelos de Anna, dizendo-lhe:

- Em vez de você ficar preocupada com esse Juca, um aleijado que não pode nem andar, pense um pouco em mim que posso ser muito mais interessante!

Anna empurra a mão dele brava:

- Vai se catar, Mário. Deixa de ser um ridículo, preconceituoso. E além de tudo, mal-informado, pois a palavra aleijado é condenada, hoje não se usa mais. O Juca é sim um cadeirante!


NOSSA ESCOLA NÃO É INCLUSIVA


Na manhã seguinte, Anna, Lídia e Cláudia esperam Pedro na entrada do colégio. Ao chegar, é questionado:

- E aí, foi ontem à casa do Juca? Ele está bem?

- Sim, meninas, quanto à saúde, tudo ótimo com ele. Só que com relação à escola, não tenho boas notícias. O Juca foi transferido para um colégio bem longe daqui.

- Mas por que, se ele mora há duas quadras daqui, vem até sozinho pelo meio da rua com sua cadeira de rodas elétrica? – Quer saber Lídia.

- Segundo os pais dele, nossa escola não é inclusiva para pessoas como o Juca. Por isto, a Delegacia de Ensino achou melhor mandá-lo para outro lugar.

- Assim, sem mais nem menos no meio do semestre? – Indigna-se Cláudia: - E por que eles dizem “pessoas como o Juca”? Ele é igual a qualquer um de nós. Única diferença é que ele usa uma cadeira de rodas!

Anna concorda com Cláudia:

- Sim, minha amiga. Na nossa cabeça o Juca é igual a qualquer um de nós. Mas nas cabeças deles que se dizem tão adultos vai ver que não.

Toca o sinal de entrada. Continuam caminhando até a sala de aula. Começa a aula de português. Discussões de verbos, predicados, frases, conjunções. Só que principalmente Anna não consegue se concentrar. Afinal, ela é a principal amiga de Juca dentro do colégio. Não é justo perder um amigo assim.

Certa altura da aula, a professora pergunta se alguém tem alguma dúvida, referindo-se ao conteúdo explicado. Anna levanta a mão, surpreendendo a todos com a seguinte pergunta:

- Professora, o que é uma escola inclusiva?

Sem jeito, ou sem saber o que responder surpreendida pela pergunta, a educadora diz:

- Desculpe-me Anna, mas esse não é o assunto da aula de hoje.

Lídia resolve reforçar o questionamento da amiga:

- É sim, professora. Pelo motivo da nossa escola não ser inclusiva, o nosso colega Juca não está presente aqui nesta sala de aula, aprendendo o mesmo conteúdo que nós!

Um grande murmurinho começa entre os alunos. Muitos só naquele momento notam a falta do Juca. A professora tenta contornar a situação, prometendo abordar esse tema na próxima aula de redação.

Só que as meninas, Pedro e Rodrigo resolvem não esperar. Ao dar o sinal do recreio, abrem mão do lanche, dos aparelhos eletrônicos e dos bate-papos. Vão direto à biblioteca pesquisar. Verificam algumas revistas e livros sobre educação inclusiva. Acessam os computadores, os sites de busca. Vão encontrando informações e imprimindo, xerocando tudo que acham interessante sobre o assunto. Reúnem-se numa mesa redonda e começam a conversar sobre o tema. Pedro é o primeiro a falar:

- Vejam só. Numa escola inclusiva se pressupõe que todos os alunos tenham a mesma oportunidade de acesso, permaneçam e aproveitem tudo, independentemente de qualquer característica peculiar que apresentam ou não!

- Isso é bonito, mas está sendo negado para o nosso amigo Juca...

- Verdade, Cláudia. Nossa escola, segundo estou lendo aqui, não tem acesso físico, equipamento para locomoção, comunicação chamada de tecnologia assistiva ou outros tipos de suporte – observa Lídia.

- Sabe, todo esse material que coletamos está me dando uma ideia...!

- O que você está planejando, Anna? – Questionam todos em coro.

Ela explica o seu plano aos colegas. Todos concordam. Vão ao encontro dos demais alunos do quinto ano e expõem algo. Eles também acham muito legal e espalham para as outras séries e turmas do colégio.

- Eu acho tudo isso uma bobeira... O campeonato InterColégios é muito mais importante – Diz Mário.

- Claro, já esperávamos isso de você - retruca Pedro.

- Não ligue para ele, pessoal – alerta Anna: - Temos muito o que fazer até amanhã cedo.

E de fato tiveram. Quando a diretora do colégio chega no outro dia, os alunos estão todos na porta da escola com faixa e cartazes gritando: “Queremos o Juca de volta! Queremos uma escola inclusiva!”

A diretora brava, fala alto:

- Quem mandou formar esse tumulto? Todos já para dentro da sala de aula...

Alguns repórteres e cinegrafistas chegam por trás com microfones e câmeras em punho. Uma jornalista pergunta:

- Diretora, a senhora está orgulhosa de ver seus alunos promovendo um gesto tão importante de cidadania?

Ela, sem graça, muda o tom de voz:

- Sim, muito, eles são o futuro do país e é importante que tenha essa consciência.

- Afinal, o que pedem os alunos? – Indaga um repórter com um bloco de papel e uma caneta nas mãos.

- Eles querem a volta de um colega cadeirante que foi transferido para outra escola e que adaptemos a nossa.

- E serão atendidos, Diretora?

- Sim, na medida do possível. Precisamos ser uma Escola Inclusiva, garantindo que todos os alunos com ou sem deficiência participem ativamente de todas as atividades na escola e na comunidade... Por isto, esta manifestação de meus alunos se faz mais do que necessária! – Responde ela num sorriso sem graça.


CONVERSANDO SOBRE FUTEBOL

Tarde de sexta-feira. Primeiro jogo do InterColégios será ali mesmo. A arquibancada está lotada de jovens torcendo. Mário, Rodrigo, Pedro e outros colegas entram em campo contra o time do colégio do bairro vizinho. Caiola, o professor de educação física deles vai dando as ordens técnicas de fora. Muita animação dentro e fora de quadra. Jogadas, cruzamentos, gols saindo para os dois lados, toma lá dá cá.

Fim do primeiro tempo. Os rapazes vão se refrescar nos vestiários, enquanto ouvem as instruções do professor Caiola. Todos estão animados com a partida, menos Mário que protesta:

- Droga, vocês precisam passar melhor a bola pra eu marcar gol. Senão como serei o artilheiro do campeonato mais um ano?

- Vai te catar, Mário – diz a Rodrigo bravo pela a arrogância do outro.

- Calma rapazes, olha a alteração dos ânimos – adverte o professor: - Lembre-se que somos uma equipe...

Volta o segundo tempo. Toda a movimentação dos dois times, gols saindo para ambos, os treinadores gritando para passar as instruções, o pessoal empolgado nas arquibancadas, onde muitas meninas reparam e comentam a beleza dos jogadores. Último minuto de jogo empatado. Rodrigo cruza a bola para Mário que está de frente para o gol adversário. Ele a chuta, mas a bola passa raspando a trave e vai para fora. O árbitro apita fim de partida.

O pessoal desce das arquibancadas e vai comemorar a partida com todos do colégio. A roda se forma com Mário, Pedro, Rodrigo, Lídia, Anna e Cláudia, a “Turma do Oitavo”.

- Eu não poderia ter errado aquele chute – lamenta Mário.

- É que você bateu na bola com o lado do pé. Se tivesse batido de bico, não teria perdido o gol! – Comenta uma voz vinda de trás deles.

Ao se virarem, os seis exclamam juntos:

- Juca, você veio!!!

Ali estava ele, sorrindo em sua cadeira de rodas elétricas. Garoto muito bonito, com estatura mediana e porte físico atlético, por de ser cadeirante, seus braços são muito fortes. Tem um rosto de forma triangular, com pele bem branca, olhos marcantes e expressivos, nariz arredondado e lábios grossos e avermelhados. Seus cabelos têm com alguns cachos e castanhos claros. Tem hábito de se vestir como um verdadeiro esportista, calças e blusas estilo adidas, camisetas brancas básicas, meias brancas e tênis confortável. É questionado por Mário:

- E desde quando você entende de futebol, chute ao gol?

- Digamos que eu entenda um pouquinho – responde com um leve sorriso.

- Juca, que bom vê-lo aqui - declara Anna: - Você está voltando para a nossa escola?

- Ainda não. Mas eu não poderia perder o campeonato deste ano. Aliás, agradeço muito o movimento que vocês fizeram por mim.

- Não foi nada, Juca. Mas ainda estamos muito longe de conseguir o nosso objetivo de termos uma escola inclusiva. Não desistiremos... – Declara Cláudia.

- Bem, pessoal, que tal irmos todos para a cantina comemorarmos? – Propõe Pedro e todos concordam.

Caminhando, Mário comenta com Anna:

- Acho que mereço um beijinho pela minha atuação – e tenta dar-lhe um beijo no rosto.

- Sai pra lá, seu metido – o empurra.

Pelo caminho muitos obstáculos para a cadeira de Juca. Em muitos degraus, a turma precisa se unir para levantá-lo. Ao chegar à cantina, a cadeira também não se encaixou na mesa. É tudo no improviso como sempre naquela escola!

Anna olha com admiração o amigo Juca, dizendo-lhe:

- Em breve toda a nossa escola estará adaptada e você poderá se movimentar livremente por toda ela.

- Esse é um sonho, Anna. Cansei de ficar só num canto do pátio sem poder me movimentar durante o recreio. Lá onde estou é tudo acessível, uma maravilha.

- Você prefere estudar lá ou aqui, Juca? – Pergunta Cláudia.

- Sinceramente, com todas as facilidades que tenho lá, eu ainda prefiro estudar com vocês, meus amigos. Sinto muita falta de todos.

- Em breve nossa escola será inclusiva e acessível. Lutaremos por isto, meu amigo! - Afirma Rodrigo.

- Só pessoal que inclusão não significa só acessibilidade – observa Juca: - A escola precisa estar preparada para receber alunos com deficiência auditiva, visual, intelectual, múltiplas deficiências, surdocegueira, com altas habilidades.

- Nós chegaremos lá – diz Pedro: - Bem, Juca, se você não se importa, eu contei ao pessoal que às vezes vejo você saindo de casa vestido de jogador de futebol.

- É, Juca, ficamos curiosos – complementa Cláudia.

- E vou deixá-los mais curiosos ainda – diz num sorriso: - Se vocês quiserem saber, vão amanhã à tarde no Estádio Olímpico Municipal que descobrirão...

Neste momento, a Diretora aparece na cantina para tomar um café. Ao vê-lo, cumprimenta-o sem graça:

- Juca, que bom vê-lo por aqui visitando seus colegas...

- Eu sou teimoso como um bumerangue, Diretora. Eu vou, mas eu volto – brinca.

- Diretora, o Juca não é visita. Ele sempre foi aluno desta escola e queremos sua volta para cá – diz Anna taxativa.

- Eu sei, minha querida. Mas as coisas não são tão simples assim. Existe toda uma burocracia por trás. Precisamos saber se o nosso bairro realmente precisa de uma escola inclusiva, por exemplo! Talvez o Juca volte no próximo semestre.

Rodrigo a olha firme e diz em nome do grupo:

- Talvez também faremos um outro protesto. Pois toda e qualquer escola precisa ser inclusiva!!!


POWER SOCCER

A curiosidade provocada por Juca tem efeito. O pessoal pediu aos seus pais e combinaram de ir sábado à tarde no Estádio Olímpico Municipal. Chegando lá, Mário comenta:

- Acho que toda a cidade teve a mesma ideia. Olha a multidão que tem aqui...

- Olha, pessoal – alerta Rodrigo apontando para uma grande faixa no alto escrita:

“Primeira Demonstração Municipal de Power Soccer”!

Todos se olham surpresos. Entram no Estádio. Arquibancadas lotadas, torcidas organizadas, faixas e tudo mais. O grupo ainda está no chão, escolhendo o local onde vai se sentar. Juca, ao vê-los de longe, vem ao encontro dos amigos devidamente uniformizado de atacante do seu time.

- Que bom que vocês vieram ver a demonstração de Power Soccer.

- E veremos outras vezes, Juca!!! – Exclama Anna.

- Power Soccer?

- Sim, Cláudia – explica Juca: - É o futebol em cadeira de rodas elétrica, um desporto coletivo que está em pleno desenvolvimento, que provoca muita adrenalina.

- Nunca imaginei que isso existisse!!!

- Mas existe, Mário. Estou treinando há quase um ano. Para jogar Power Soccer é necessário o domínio de si próprio, uma boa destreza de movimentos, ter uma cadeira de rodas elétrica e jogar com uma bola com diâmetro maior que uma bola comum de futebol. Esta modalidade, criada na França em 1991, está aberta às pessoas que utilizem cadeira de rodas elétrica. Bem, o técnico está me chamando. A partida vai começar.

A turma vai rapidamente se sentar. Inicia-se a partida. São oito jogadores para cada lado, sendo que quatro entram em quadra e quatro ficam no “banco” e vão se revezando durante toda a partida. É uma modalidade democrática, pois meninos e meninas jogam juntos em times unissex.

Quem ainda não conhecia essa modalidade esportiva, fica encantado. Na parte da frente da cadeira elétrica é colocado um pára-choque, que no final de cada jogo é retirado, sem que a cadeira sofra algum dano ou alteração. Os jogos desenvolvem-se num campo de basquetebol normal aproveitando os seus limites espaciais. Os jogadores são muito rápidos na movimentação das cadeiras, cruzamento de bola, passes, lançamentos e muitos gols com comemorações dentro e fora de quadra. E Juca não perde uma oportunidade...

A duração do jogo é de quinze minutos. Em cada uma das duas partes e as balizas são constituídas por duas traves. De forma a evitar que a bola não deixe o campo de jogo, existem planos inclinados nas partes laterais do campo. Apesar de os princípios do jogo serem os mesmos do futebol clássico, algumas regras foram acrescentadas, de forma a compensar a não existência da terceira dimensão.

Mário tenta alisar os cabelos de Anna. Mas ela empurra a sua mão, ficando brava.

Num momento e euforia, Anna olha para todos nas arquibancadas. Várias entidades de pessoas com deficiências estão lá. Crianças, jovens e pessoas com diferentes deficiências físicas, pessoas cegas, pessoas surdas, pessoas com síndrome de Down ou autistas. Todas alegres, torcendo, cantando, comemorando os gols, tomando refrigerantes, comendo pipocas e lanches. Alguns até com namorados.

- Veja só, são pessoas iguais a todos nós, Cláudia. Por que elas precisam estudar em escolas separadas?

- Também acho, Anna. Mas no nosso caso, sabemos que essa união é prejudicada por não termos uma escola inclusiva, adaptada.

- Podemos mudar isso com a nossa campanha “Volte Juca”! Aliás, acabo de ter uma ideia. Lembram-se que a Diretora comentou que não tem certeza se o nosso bairro precisa realmente de uma escola inclusiva?

- O que você está planejando agora, Anna? – Questiona Lídia.

- Que tal nós mesmos realizarmos uma pesquisa no nosso bairro? – Responde num sorriso.

Em quadra, Juca continua marcando gols. A partida acaba e o seu time vence. Todos descem para comemorar com os jogadores. Mário comenta:

- Parabéns, Juca. Hoje você foi mais artilheiro do que eu...

- Um a zero para mim! – Brinca Juca.

E na empolgação das comemorações, Anna não se contém e dá um beijo na face do amigo goleador...

UMA PESQUISA NO BAIRRO

A “Turma do Oitavo” está reunida na biblioteca da escola decidindo como será realizada a pesquisa no bairro. Outros alunos se interessam pela ideia e se juntam a eles.

De repente, chega Mário com uma notícia não muito boa:

- Pessoal, o professor Caiola foi chamado para assumir o cargo em um concurso público que ele passou em outra cidade e deixou a nossa escola.

- Como assim? – Questiona Rodrigo: - Amanhã temos o segundo jogo do InterColégios. Hoje à tarde temos treino. Não podemos jogar sem um treinador.

- Acho que tive uma ideia...!

- O que você está planejando, Pedro?

- Calma. Vão normalmente para o treino de hoje que vocês verão – responde Pedro num sorriso.

Após a aula, as meninas da turma e outros alunos iniciam a pesquisa. Vão de casa em casa, perguntando se ali existe pessoa com deficiência, o tipo, grau, se estão em alguma escola especial ou se não estão estudando. Questionam se eles desejam estudar na escola do próprio bairro. Enfim, tudo é feito com muita animação.

Enquanto isso, os rapazes reunidos no meio da quadra de esportes da escola esperam Pedro chegar com a novidade. Um tempo depois, ele aparece acompanhado do Juca e anuncia:

- Pessoal, éis aqui o nosso novo treinador...

- O Juca!!! – Exclama Mário.

- E por que não? – Anima-se Rodrigo: - Ele é um ótimo boleiro, entende muito de futebol. E depois, será uma forma de mantermos a sua presença aqui na escola até conseguirmos sua volta definitiva. Quem concordar levante a mão.

Todos levantam. Mário, sem graça e para não ser criticado, levanta o braço timidamente.

O treino começa. Juca, de sua cadeira de rodas e da beira da quadra, vai orientando, mudando o esquema tático, colocando e tirando jogadores, fazendo experimentações. Exigente, ele não dá mole ao time que tem que suar muito. E é assim também no dia seguinte durante a segunda partida do campeonato. Exigente e muito técnico, o que faz com que o seu time tenha a primeira vitória!

Os dias vão avançando. A pesquisa no bairro vai revelando um número significativo de crianças e pessoas com deficiência ali que ninguém nunca notou.

Comandado por Juca, o time da escola vai avançando no campeonato sem perder. Partida à partida, a animação de todos aumenta. Até que chegam à final.

Após duas semanas, o pessoal dá a pesquisa por concluída. Encontram-se na biblioteca da escola para conversarem.

- Eu não imaginava que tínhamos tantas pessoas e crianças com deficiência no nosso bairro – comenta Cláudia.

- Talvez nós não os reparamos porque eles ficam dentro de casa por falta de oportunidades na sociedade para se mostrarem – observa Anna.

- Principalmente oportunidade de estarem na nossa escola. Por isto é que precisamos lutar para que nossa escola seja inclusiva – aponta Rodrigo.

- Tudo bem, moçada – diz Lídia: - Agora que temos os dados, o que faremos com eles?

Anna responde:

- Vamos escrever como um trabalho escolar. A gente coloca todos os dados, os nomes, endereços e tipos de deficiência e junto a gente escreve uma carta falando da nossa vontade de ter uma escola inclusiva e todo esse pessoal como nossos colegas. Depois a gente forma uma comissão e entrega à Diretora.

- Eu acho também que como todos nós fizemos parte desse trabalho, seria legal enviar uma cópia para o e-mail de cada um para guardarmos como recordação! – Sugere Mário.


Uma semana depois. O trabalho é entregue à Diretora.

Dois dias após, véspera do início das férias de meio de ano, é o dia do jogo final do InterColégios. Arquibancadas lotadas, muita animação. O time em quadra e Juca comandando tudo de sua cadeira de rodas. Um jogo duro, disputado. Mas o boleiro de Power Soccer, ali na condição de treinador de um time de futebol de salão não dá mole. Mexe aqui, mexe acolá. Gol a gol até que, há um minuto da final, Pedro faz o gol da vitória!!!

Todos estão comemorando no meio da quadra. Menos Mário que não se conforma.

- Liga não, Mário – diz Anna: - Nem sempre podemos ser os melhores em tudo. O ano que vem você tenta recuperar o seu lugar de artilheiro...

Continua a comemoração. Anna abraça Juca e Mário parece ficar com ciúmes. Neste momento, chega uma funcionária da secretaria chamando toda a “Turma do Oitavo” para sala da Diretora.

Ao entrarem, notam que ela está bem nervosa com o trabalho de pesquisa nas mãos:

- De quem foi a ideia de mandar cópias desse trabalho de vocês que nem tinha o aval da escola para todos os repórteres da cidade???

- Desculpe, Diretora... – Anna toma a palavra: - Mas nenhum de nós mandamos trabalhos para repórteres. Só entregamos à senhora…

- Alguém mandou sim. Hoje todos os jornais e televisões locais estão dizendo que os alunos da nossa escola estão dando um grande exemplo de cidadania, pedindo a inclusão de seus amigos com deficiência aqui!!!

- E isso não é bom, Diretora? – Pergunta Mário.

- Bom, rapazinho? Os repórteres estão pressionando o Prefeito para saber se ele vai atender o pedido de vocês e agora há pouco o Secretário da Educação ligou furioso comigo.

Anna olha seus amigos, questionando-lhe:

- Será que fizemos a coisa certa?


UMA NOVA ESCOLA

Ao voltarem de férias, todos os alunos têm uma surpresa. A escola está toda com as modificações arquitetônicas necessárias para atender os requisitos da acessibilidade. Já do lado de fora, além da nova pintura, muitas novidades. As guias rebaixadas para pessoas em cadeiras de rodas. Travessia de pedestre sinalizada, semáforos sonoros para cegos. Um ponto de ônibus que permite o embarque e desembarque seguro. Calçadas conservadas e livres de canteiros de flores, postes, caixas dos correios, orelhões. A banca de jornal foi melhor posicionada para não atrapalhar a ida e vinda de todos.

Entram na escola.

- Que lindo! – Exclama Pedro.

Lídia olha para Anna, observando:

- Respondendo sua pergunta feita antes das férias, sim minha amiga, fizemos a coisa certa!

- Vitória nossa, pessoal – observa Anna: - Acessibilidade significa não apenas permitir que pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida participem de atividades que incluem o uso de produtos, serviços e informação, mas a inclusão e extensão do uso destes por todas as parcelas presentes em uma determinada população. Li isso durante as férias. Os alunos cadeirantes como o Juca são os que mais sofrem com a falta de estrutura física adequada. Apenas cerca de 30% das instituições de ensino privadas são acessíveis.

- Agora nossa escola também é. Viva!!! – Gritam todos comemorando.

Correm por todos os cantos para verem as modificações. A entrada de alunos está preferencialmente localizada na via de menor fluxo de tráfego de veículos. Livre de escadas e com espaço suficiente para a circulação de uma pessoa em cadeira de rodas, interligando o acesso dos estudantes a todos os ambientes da escola, incluindo a área administrativa.

Corrimãos das rampas foram instalados em duas alturas diferenciadas do piso, como nas outras instalações complementares, piscinas, ambulatórios, locais de descanso.

- Meu, olha que portas grandes!!! – Admira Lídia.

As portas, inclusive de elevadores, passam a ter um vão livre maior, respeitando as distâncias de aproximação frontal e lateral.

A turma chega à sala de aula. As lousas estão instaladas a uma altura mais baixa para os cadeirantes escreverem, estudarem com mais conforto. Todos os elementos do mobiliário interno, inclusive a lousa, agora são acessíveis, isto é, garantem áreas suficientes para aproximação e manobra de cadeira de rodas. Levam em conta, para a disposição do mobiliário e outros objetos, a faixa de alcance visual dos cadeirantes. As prateleiras foram rebaixadas e reservadas para os alunos em cadeira de rodas.

Alguém fala de um canto da sala:

- Vocês estão atrasados para o primeiro dia de aula, moçada...

Ao se virarem, uma surpresa ainda maior. É Juca em sua nova carteira. Na escola inclusiva, Pelo menos 1% do total das carteiras – com no mínimo uma para cada duas salas de aula – deve ser acessível a cadeirantes. As mesas ou superfícies devem possuir altura livre inferior de no mínimo 0,73 m do piso. A mesma regra serve tanto para as mesas em sala de aula quanto para os refeitórios.

Todos correm para abraçá-lo. Uma festa. O brilho nos olhos de Anna são evidentes.

Neste momento, a Diretora entra na sala de aula, dizendo-lhe:

- Parabéns, meninos. Vocês venceram...

- Não, Diretora. Quem venceu foi a cidadania!!! – Responde Anna, sendo aplaudida pelos colegas.

Dá a hora do recreio. Todos correm para continuar olhando as modificações da escola. No pátio não existe mais degraus e qualquer obstáculo que impeça a circulação de cadeira de rodas. Corredores com larguras para respeitar a circulação, piso para facilitar a mobilidade e evitar acidentes. Agora Juca pode circular por todo o pátio, sem precisar ficar pelos cantos.

Os sanitários, tantos dos alunos como dos professores – com no mínimo um para cada sexo –, agora possuem barras de apoio para o vaso sanitário e para os lavatórios. No geral, todos os elementos do mobiliário urbano da edificação, como bebedouros, guichês e balcões de atendimento, quadra, parque, biblioteca, laboratórios, lanchonetes, quadro de avisos passam a ser acessíveis, respeitando as áreas de aproximação e manobra livre.


O GRANDE CAMPEONATO DE POWER SOCCER

Ainda caminhando pelo pátio, a turma nota algo inesperado. Novos alunos chegaram à escola. São justamente todas aquelas crianças que foram pesquisadas e ninguém sabia de sua existência. Ou pelo menos não eram observadas. Algumas cegas andam com bengalas pela escola agora com sinalização no chão. Outras conversam na linguagem de sinais. Novos cadeirantes como o Juca. Alunos com outros tipos de deficiências. Enfim, agora estão todos na mesma escola!

Vão conhecer a nova biblioteca, um verdadeiro portal de conhecimento e aventuras. E quantas modificações! Acesso livre sem desnível e catracas. As mesas encaixam cadeiras de rodas. Se encantam com o novo acervo em braile para que os colegas cegos lerem com as pontas dos dedos. Audiobooks e CD-ROM para auxiliar os estudos desses alunos. Assistentes para leitura, ou seja, pessoas para lerem para os alunos cegos. Lupas e lentes de aumento.

Os estudantes surdos também ganharam atenção. Agora na biblioteca há interpretes de Língua Brasileira de Sinais. Uma sala equipada com televisor com sistema de legendas ocultas para usuários surdos, o chamado “closed caption”, permitindo que tudo o que é dito apareça escrito na tela.

Novos funcionários foram contratados e treinados para o serviço de orientação estimulante e adequado às necessidades dos diversos tipos de alunos.

Anna, olhando todas as modificações e adaptações na escola, começa a chorar emocionada. Todos seus amigos abraçam-se numa grande roda de confraternização. Juca entra no meio da roda e segura a mão de Anna com carinho e trocam olhares puros de admiração um pelo outro...

- Só que até hoje não sabemos quem mandou cópias dos nossos trabalhos aos repórteres – recorda-se Cláudia.

- U é, meu pai é advogado – observa Mário: - Sempre ouvi ele dizer que a imprensa é o quarto poder. Eu quis testar.

Todos o olham surpresos. Mário dá apenas um sorriso.

Um mês depois...

Juca chega à escola chateado. Anna logo percebe:

- O que foi, meu amigo?

- É que a Secretaria de Esportes vai ter que reformar o Estádio Olímpico Municipal. O meu time de Power Soccer ficará um tempo sem um espaço adequado para treinar. Iríamos ter o nosso primeiro campeonato no final deste ano. Agora nem sei se haverá campeonato.

Lídia dá uma sugestão:

- Hoje nossa escola está toda adaptada. Os políticos e a Diretora vivem dizendo que é a Escola Modelo do município. Então, por que vocês não vêm treinar aqui?

- Verdade, mas será que a Diretora permitirá? – Questiona Mário.

- Bem, ela vive dizendo que a escola é nossa – observa Cláudia: - Então vamos expor a nossa vontade.

Anna, Juca, Mário, Rodrigo, Lídia, Cláudia e Pedro, vão até à diretoria pedir a liberação dos treinos na escola.

- Eu nunca vi uma turminha tão ativista como vocês, meninos – comenta a Diretora.

- Agradecemos o reconhecimento, Diretora – Anna sorrir: - Mas e quanto ao nosso pedido.

- Bem, se eu negar, vocês são capazes de fazer outro movimento contra mim – brinca a Diretora: - Por outro lado vocês lutaram para ter uma escola inclusiva. Nada mais justo que usem ao máximo todos os recursos disponíveis.

Todos gritam um viva!!!

- Só que tem uma coisa - alerta a Diretora: - Eu não tenho como de imediato escalar um funcionário para acompanhar e cuidar desses treinos. O grupo de vocês ficará responsável por isso.

- Pode deixar, Diretora!!! - Exclama Anna num sorriso.

A rotina escolar vai ganhando um novo ritmo. Nasce entre os alunos com e sem deficiências uma cooperação em sala de aula. Em trabalhos em grupos os mais habilidosos ajudam os outros numa aprendizagem coletiva. Surgem os interesses mútuos. Todos começam a explorarem assuntos de interesses comuns. E nesse espírito de cooperação, além da sala de aula, mas também por todas as dependências da escola, simultaneamente, eleva a autoestima de todos.

Quinta-feira à tarde. Chega à escola duas vans trazendo os parceiros de Power Soccer de Juca. Como combinado, a “Turma do Oitavo” está lá para recebê-los e dar todo o apoio ao treinamento.

- Olha isso, moçada!? – Exclama um deles.

Os jogadores ficam admirados pela estrutura inclusiva da escola. Já na quadra, o treinamento inicia-se. É só cadeira de rodas “voando”, gols saindo e muitas conversas sobre técnicas e estratégias de jogo. Ajustes.

A turma de Juca assiste a tudo sentada na arquibancada, atendo às necessidades que os jogadores podem ter. E entre eles, Anna olha Juca com um brilho nos olhos...

Os dias de convivência entre os alunos com e sem deficiência é uma experiência enriquecedora para todos! Nasce a oportunidade de compreender melhor o seu semelhante que, por qualquer motivo, são diferentes, seja na maneira de se vestir, língua, deficiências, raça, capacidades. Os colegas com deficiências não são considerados como “especiais” ou “coitadinhos”. Surgem a cada dia, a cada momento, verdadeiros laços de amizades, resultando em apoios reais.

Aprendendo que todos nós somos diferentes, deixamos de fazer brincadeiras cruéis e nos tornamos todos amigos. Assim a escola não tem mais espaço para o bullying!

Algumas semanas se passam. Durante um treinamento de Power Soccer, não só aquela turma, mas muitos alunos começam a acompanhar com interesse e admiração. Uma funcionária da secretaria da escola chega à quadra, sobe pela arquibancada e entrega um bilhete à Anna. Ela agradece, abre e ler. Levanta-se e fala alto:

- Pessoal, pessoal para tudo!!!

Ela desce correndo para o meio da quadra e todos a acompanham curiosos, formando um círculo em torno dela, misto entre seus colegas e os jogadores em suas cadeiras de rodas. Anna revela a novidade:

- Diz aqui no bilhete que o Secretário dos Esportes ficou sabendo de todo o nosso empenho, conversou com o Prefeito e decidiu. Vamos sim ter no final do ano o Primeiro Campeonato Municipal de Power Soccer e ele será realizado aqui na nossa escola.

Uma alegria contagia a todos. Muitas comemorações e abraços.

- Isso só foi possível porque hoje a nossa escola é inclusiva, tem espaços, adaptações e oportunidades para todos!!! – Grita Juca.

- Tudo é uma questão de acreditar e lutar pelos nossos ideais – observa Pedro: - A maior riqueza humana é a convivência. A partir dela, tudo acontece naturalmente.

A comemoração continua. No meio de toda aquela alegria, Anna olha nos olhos de Juca. Ficam ali se olhando por um tempo. Tudo aquilo e pessoas em volta parecem não existirem. Ela, impulsionada pela ocasião e sentimentos que ainda nem sabe definir, aproxima-se dele e lhe dar um leve beijo na boca, ambos de olhos fechados. Ao terminar, Juca confessa:

- Já há algum tempo eu desejava isso, Anna. Esse foi o gol mais lindo e importante da minha vida!!!

- E junto iremos marcar muitos outros, Juca. Você é o meu primeiro amor...


FIM

Emílio Figueira - Escritor

Por causa de uma asfixia durante o parto, Emílio Figueira adquiriu paralisia cerebral em 1969, ficando com sequelas na fala e movimentos. Nunca se deixou abater por sua deficiência motora e vive intensamente inúmeras possibilidades. Nas artes, no jornalismo, autor de uma vasta produção científica, é psicólogo, psicanalista, teólogo independente. Como escritor é dono de uma variada obra em livros impressos e digitais, passando de noventa títulos lançados. Hoje com cinco graduações e dois doutorados, Figueira foi professor e conferencista de pós-graduação, principalmente de temas que envolvem a Educação Inclusiva. Atualmente dedica-se a Escrever Literatura e Roteiros e projetos audiovisuais.

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