ESTRADA DE TERRA – Emílio Figueira / Nov. de 2000 - Técnica: Óleo sobre tela. Med. 0,40 x 0,30
Em seu canto solitário, sentado na calçada, o mendigo pensa: “Andando pelas ruas, vejo pessoas a se desviar de mim. Madames, senhores, crianças, todos eles com medo que eu os ataque ou peça esmolas. Será que é por que eu sou uma pessoa com deficiência, vivendo sozinho pelo mundo, sendo levado por duas muletas? Ou será que é por que eu não tenho condições de trabalhar e, por isso, vivo nas ruas, vestindo uns trapos que acho nas latas de lixo? Não sei... Como é dura a vida de um pobre mendigo. A gente não tem ninguém para conversar”.
Alguém começa a se aproximar: “Lá vejo um moço vindo em minha direção. O que será que ele quer? Será que ele é da Polícia e vem encrencar comigo? Será que é um amigo? Não sei... O jeito é esperar para ver”.
O moço se aproxima dele e se abaixa:
– Bom dia...
– Bom dia – respondeu o mendigo.
– Posso conversar contigo, amigo?
– O que um moço fino quer com um pobre mendigo?
– Apenas, como eu já disse, ter uma conversa.
– Muito bem, amigo. Sente-se e comece, sou todo ouvido.
– Conte-me a sua história, senhor. Quem sabe eu possa ajudar-lhe.
– Eu não tenho muito para contar, moço. Só sei que estou nesta vida há vinte anos, passando humilhação, fome, frio... Tudo que uma pessoa pode sofrer na vida, eu sofro. Mas o que me entristece mesmo é de pensar que já fui feliz e tive família.
– Conte-me dela ¬– o moço pede.
E o mendigo continuou narrando a sua trajetória:
– Eu vivia feliz com minha mulher e meu pequeno filho. Minha profissão era de advogado. É moço, já fui um doutor. Até que um dia, cruelmente, fui vítima de um acidente. Por causa disso, fiquei inválido em cima de uma cama. Depois de dois anos, eu e minha mulher tivemos uma grave discussão. No dia seguinte, ela foi embora com meu pequeno filho de cinco anos. Uns meses depois, ei já estava andando de muletas. Foi quando, desesperado de tanta saudade deles, caí na bebida e no jogo. Infelizmente, eu perdi todos meus bens. Por isso, moço, hoje eu vivo como um mendigo pelas ruas.
– Escute, diga-me uma coisa: o senhor nunca mais teve notícias deles?
– Tive sim, moço, fiquei sabendo que ela morreu há nove anos no Rio de Janeiro. Mas dele, nunca mais tive notícias.
– Quais eram os nomes deles?
– Ela se chamava Elizete e ele Ademir – respondeu o mendigo.
– E o seu, meu senhor?
– O meu é Jaime.
Neste momento, o moço se levanta, estende a mão direita e diz:
– Vamos para minha casa, lá é o seu lar, meu pai. Procurei o senhor durante quinze anos.