O ESTRANHO VIZINHO

DESENHO SEM TÍTULO – Emílio Figueira / lápis sobre o sulfite

Numa pequena cidade de interior, havia um sítio isolado na zona rural. Nada de anormal se não fosse o fato de sua casa ser pintada por duas cores fortes de vermelho. O que, aliás, não era comum na região.

Ali, morava um senhor que tinha prazer em estar solitário em sua residência. Tinha se mudado há pouco para lá vindo da grande capital, ele aparentava ser aposentado. Só saía se fosse necessário, como para fazer compras na cidade. Nessas ocasiões, estava sempre sorridente e cumprimentava a todos, mas só conversava o necessário, voltando rapidamente à sua propriedade.

Esses fatos instigavam a curiosidade daquele povo. Quem realmente era ele? Por que gostava de viver isolado? Seria uma pessoa tímida? Não gostava de ter amigos? 

Outros até deixavam a imaginação criar asas. Poderia ser alguém foragido da cidade grande. Um traficante procurado, talvez... Um esquizofrênico, quem sabe... Olha que em noite de lua cheia, ele poderia até se transformar em lobisomem. E a fértil criatividade das pessoas de interior – as quais ainda encontram tempo para imaginar e delirar coletivamente – ia longe.

Com o tempo, os vizinhos do sítio, passaram a observá-lo melhor a partir das cercas de suas casas. A casa sempre muito bem-pintada e limpa, o caminho e todo o terreiro carpidos, a árvore frutífera carregada e cheia de vida, os patinhos gordos e tranquilos nadando no laguinho, tudo isso dentre tantos outros aspectos, tudo muito cuidado com esmo. 

Foi quando, um dia, puderam concluir que aquele homem de cidade grande apenas se isolou num sítio para encontrar a felicidade que habita nas coisas simples da vida!

Emílio Figueira - Escritor

Por causa de uma asfixia durante o parto, Emílio Figueira adquiriu paralisia cerebral em 1969, ficando com sequelas na fala e movimentos. Nunca se deixou abater por sua deficiência motora e vive intensamente inúmeras possibilidades. Nas artes, no jornalismo, autor de uma vasta produção científica, é psicólogo, psicanalista, teólogo independente. Como escritor é dono de uma variada obra em livros impressos e digitais, passando de noventa títulos lançados. Hoje com cinco graduações e dois doutorados, Figueira foi professor e conferencista de pós-graduação, principalmente de temas que envolvem a Educação Inclusiva. Atualmente dedica-se a Escrever Literatura e Roteiros e projetos audiovisuais.

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem